domingo, 26 de julho de 2015

Desconfiômetros - Saibam quantos...



Dentre os princípios éticos e morais que regem as relações humanas, revela-se com maior precisão a modalidade instintiva denominada DESCONFIÔMETRO. Poder-se-á afirmar que tal mecanismo impede, não raro, a manifestação de pensamentos acintosos em relação ao interlocutor circunstante. 

O desconfiômetro proporciona extremada capacidade de discernimento, compatível com as variáveis da vida. Há, porém, casos em que paixões mais fortes nos arredam de teor comum na vida, neutralizando nossos afetos e produzindo ações avessas daquilo que fazia separar a maneira de pensar e sentir. Daí a importância de desconfiômetro, sem o qual predominariam a vingança e a ambição, cegando-nos, a ponto de lançar-nos em projetos opostos às nossas ideias e sentimentos. 

Nada mais irritante do que deparamo-nos com pessoas que não tem o dom de desconfiômetro. Em geral são de um primarismo arrogante, buscando por gosto os insultos, e por isso querendo precipitar-se do cume da distinção na geral insignificância.Têm compostura de molde a deixar visíveis os arranzéis de ataque pessoais. Animam-se à teimosias ante nossa capacidade de pontificar na vida em consonância com as deliberações preliminares oriundas da escola da vida. Ufanam o peito com ares de baiacus, instigando à rebeldia para depois deixar entregues (as suas vítimas) à própria sorte. 

Desconfio, caro leitor, quando encontrares essa virulenta espécie, arrotando pseudo competência, de forma bisonha e renitente. Tive o desprazer de encontrar este tipo de supra-sumo da boçalidade, o qual queria ganhar celebridade a expensas minhas, tendo por tal investida resvalado no ridículo o tal sacripanta. Não lhe dei resposta nem importância; E dou um aviso aos infelizes e asquerosos navegantes da boçalidade açodada pelas perfídias; Podem bramir, injuriar, vituperar, doestar, espumar de raiva fingida e paga. Não abrirei polêmica com os tais,até porque, por mais que se esbofem, nunca conseguirão rasgar brecha em minha inconfundível e inexpugnável e honrada trajetória de vida. Desculpem-me pelo auto-elogio mas São Paulo também assim o fez, por ocasião da segunda epístola aos Coríntios, Capítulo XI.

Aos que vierem com inquirições malsãs e maquiavélicos, faço a advertência de que até agora nem toquei a campainha para chamar os lacaios, nem bati castanholas aos cães de casa. Ladrem e cainhem; portanto, lá no pátio à vontade, que eu por cá me fico muito bem seguro de mim, e cada vez mais aferrado às minhas ideias. 

Sei que os encontrarei(os boçais) na estrada da vida. E para que esbravejem mais esses cainços e cada dia mais se mordem e remordam de impotente desespero, comunico-lhes que DEUS dotou-me de singular manancial de perspicácia para vislumbrar recônditas minudências. 

Ao leitor amigo a observação de que estas ideias não apenas as que alguns pensam em silêncio, e que eu prefiro pensar em voz alta. Se está errado, corrigir-se-á. Se está certo, tanto melhor, de um modo ou de outro, dizer a verdade às vezes aproveita, não propriamente a quem diz, mas especialmente a quem ouve. Aprendi isto na escola da vida. 

Por Marcos Pinto – historiador e advogado apodiense
19.03.1999

quarta-feira, 15 de julho de 2015

Subsídios para a história dos municípios de Felipe Guerra e Caraúbas


08/07/1740 – Margarida de Freitas e sua irmã Antonia de Freitas Nogueira, filhas do fundador Manoel Nogueira Ferreira, recebem concessão de Carta de Datas e Sesmaria passada pelo Capitão-Mór do Rio Grande do Norte Francisco Xavier de Miranda Henrique, dando-lhes três léguas de terras de comprido e uma de largo na lagoa do Pacó entre o Boqueirão e o Apanha-PEIXE.

Por Marcos Pinto - historiador e advogado apodiense.

domingo, 5 de julho de 2015

II Guerra Mundial no RN

A importância de Natal na Segunda Guerra Mundial (1939-1945) surge com veemência nas comemorações dos 60 anos do fim da mesma. A historiografia potiguar contribui com a discussão do tema ao incluir nele dois historiadores que vivenciaram, relataram e pensaram o período: Luís da Câmara Cascudo e Tarcísio Medeiros.

Vou trazer à tona os elementos e fatos analisados pelos dois historiadores, seja do ponto de vista geopolítico e antropológico como abordado por Tarcísio Medeiros (Mariz & Suassuna, 2002, p. 325), seja do ponto de vista dos relatos sociais, culturais e políticos tal quais enfatizados por Luís da Câmara Cascudo.

Luís da Câmara Cascudo em sua História da Cidade do Natal (1999), faz uma descrição minuciosa acerca da localização – datada historicamente – de Parnamirim. “O topônimo”, diz Cascudo, “está num mapa de Marcgrave, o Brasiliae geographica & hydrographica tabula nova” (p. 421). Única referência. O nome deve-se a um “tabuleiro entre colinas em meias-laranjas, com a lagoa que lhe deu nome” e já em 1927 torna-se um “campo de pouso para os aviões da Latecoère” (p. 421). Depois viria a Air France e a italiana “Ala Vitória”.


Cascudo atribui ao coronel Tavares Guerreiro a serventia aeronáutica de Parnamirim. Os norte-americanos e os alemães utilizavam hidro-aviões subindo e descendo na foz do rio Potengi. Parnamirim inicia sua notoriedade graças à presença de ilustres que pousavam e decolavam de seu campo (1999, p. 421).

Com a II Guerra Mundial e em 1942, com a construção de uma Base Aérea da Força Aérea Brasileira veio a “consagração universal”. Tinha funções de patrulha e vigilância. Ao mesmo tempo é instalada pelo almirante Ari Parreiras a Base Naval na área do Refoles. No auge da guerra, “fez içar o pavilhão nacional em oito destróiers escolta. E mais o dique flutuante Potiguar e a barca-oficina Potengi” (1999, p. 422).


Os americanos construíram em Parnamirim sua base. Segundo Cascudo,

pistas de dois mil metros facilitavam a descida imediata de 250 aviões. Mil e quinhentos edifícios abrigavam dez mil homens. Todos os serviços modernos, todos os recursos da técnica, possíveis ao gênio e ao dinheiro, estavam abundantemente acumulados em Parnamirim (1999, p. 422).

Relata também que o consumo de gasolina médio chegavam a cem mil litros diários, vindos de um “pipe line” a 20 quilômetros de distância, abastecidos, por sua vez, dos navios tanques do porto de Natal. Também, de fundamental importância, era a pista asfaltada (20 km) que ligava Natal a Parnamirim.

Para Cascudo, Parnamirim Field não teria sido concretizada sem a importante contribuição dos brasileiros locais. Estes se misturaram com os militares americanos e sua cooperação foi sempre lembrada pelos próprios americanos (1999, p. 423).

Para os potiguares tudo era novidade, “tudo era novo, enorme, e regular [sic], desde os caminhões de dezesseis rodas, com reboque, até os filmes novíssimos que passavam quinze meses antes da distribuição para o grande público” (CASCUDO, 1999, p. 423). A presença americana também foi sentida através dos infortúnios. Segundo Cascudo, mais de cem túmulos no Cemitério do Alecrim atestavam a luta contra o nazi-facismo.

Ao derredor do Campo, surgiu a Vila de Parnamirim, pobre e singela, mas com grupo escolar, luz elétrica, urbana. Era parte do município de Natal, então administrado pelo prefeito Sylvio Piza Pedroza.

Cascudo enfatiza a importância de Parnamirim apontando sua estratégica presença no Atlântico Sul. Para tanto cita o General norte-americano Charles Gerardt e o próprio presidente Franklin Delano Roosevelt para quem “a encruzilhada estratégica tão importante para a realização das campanhas do Norte da África e da Sicília” (1999, p. 424). Importantes na defesa de Natal, diz Cascudo, foram o general Cordeiro de Farias, o chefe de polícia local, André Fernandes de Sousa, Godofredo Rocha, chefe da Defesa Civil (1999, p. 425).

Natal inteira, localizada próxima a Base, foi preparada e organizada em todos os sentidos e áreas (naval, aérea, terrestre). Fizeram surgir “casas, estaleiros, cais de atracação e subida para os aviões anfíbios, armazéns, hospitais, cassinos” (Cascudo, 1999, p. 424). Na “Rampa da Limpa” atracavam os grandes 24 PBY, os hidroaviões patrulhas da USS Navy, os “Catalinas”, os bombardeios B-29 e os clippers de 75 passageiros . A cidade inteira vivia o clima de guerra. Os black-out eram constantes, os abrigos públicos contra bombardeios, os voluntários para todas as necessidades. (Cascudo, 1999, p. 425).


Tarcísio Medeiros num artigo em seu Estudos de História do Rio Grande do Norte(2001), enfatiza a importância da localização estratégica de Natal e do Rio Grande do Norte, assim como o do próprio Brasil, para o domínio estratégico e militar da costa do Atlântico Sul. O Rio Grande do Norte, desde o período de sua ocupação colonial sempre foi ponto estratégico, no século XX, a II Guerra Mundial foi prova disto (MEDEIROS, 2001, p. 117-118).

No início da guerra, três navios militares brasileiros faziam a guarda da costa potiguar: Cananéia, Camaquã e Camocim. Estes apoiados por aviões da FAB (Força Aérea Brasileira). Em 1941 Natal recebia o 16º Regimento de Infantaria, parte da 14ª Divisão de Infantaria. Também a Base Naval de Natal recebia o seu comandante, Ary Parreiras. Já “a aviação, unificada desde 18 de janeiro [de 1941] com a criação do Ministério da Aeronáutica, possuindo o campo de ‘Parnamirim’, estabeleceu a sede da 2ª Zona Aérea, cujo comando foi confiado ao Brigadeiro Eduardo Gomes” (MEDEIROS, 2001, p. 119).


A preocupação central para o Brasil era o Afrika Korps de Rommel, situado na África do Norte, com seus aviões, submarinos e homens que podiam avançar sobre a costa nordestina. Para dar conta desta ameaça, “foi decretada a mobilização geral, não somente militar, com o chamamento de reservistas de várias classes para a caserna, como ainda de ordem econômica, para o que, neste particular, foram criados órgãos especializados” (MEDEIROS, 2001, p. 119), voltados para a economia de guerra e seus esforços (racionamento, alocação de mão-de-obra, busca de matérias-primas essenciais, etc.).

Ateste-se também a presença da Cruz Vermelha, a importância da Defesa Civil (inclusive com a importante participação de Luis da Câmara Cascudo), a Polícia local, que possibilitaram a defesa interna e o serviço de contra-espionagem. Também foram significativos as polícias de black-outs, os alarmes estratégicos e os abrigos públicos. Os exercícios de black-out foram realizados na cidades que estava protegida pela artilharia aérea, holofotes e aviões. A partir de maio de 1943

a cidade viveu em black-out ininterrupto, enquanto durou a guerra na África. Nesse período, por três ocasiões, foram dados alertas reais com duração de mais de duas horas, por terem sidos detectados sinais de aproximação de forças inimigas, felizmente sem conseqüências maiores, porém causadores de grande susto à população recolhida aos abrigos, e para muitos que fugiram para o interior do Estado (MEDEIROS, 2001, p. 120).

Medeiros informa que em outubro de 1939 o Congresso das Nações Americanas estabelece uma Zona de Segurança que envolveria o continente americano. Tomado os limites do Brasil, estabeleceu-se uma “Zona de Guerra, subdividida em Teatros de Operações. (…) Nessa delimitação, o Estado do Rio Grande do Norte foi enquadrado no Teatro de Operações (TO) do Nordeste (NE)” tendo em vista sua localização estratégica (2001, p. 121).

O importante era estabelecer a defesa por meios navais e aéreos. Foram criados para tanto: “16º R.I., GBC (40º e 42º BC), AD/14 – com: 4º GADo – 2º /8º RAM – 3º RADC, 1º/3º RAAAe, 2º/GMAC, 2º BCC, 1 B. de Engenhos e 1 B. de Comunicações” (Medeiros, 2001, p. 122). Tudo isso agrupado ao longo do litoral potiguar e em alguns pontos do interior. Medeiros descreve com acuidade as estratégias de defesa que poderiam ser utilizadas caso a costa fosse invadida ou atacada (Cf. 2001, p. 122-123).

Natal é modificada drasticamente com os eventos. De cerca de 60 mil habitantes, viu sua população quase duplicar. Milhares de militares: americanos e brasileiros. Além da mão-de-obra atraída pelos grandes empreendimentos militares. Os americanos eram grandes gastadores e dinamizaram a economia local, principalmente o comércio e os cabarés (MEDEIROS, 2001, p. 125).


Parnamirim Field foi construída com mão-de-obra potiguar e milhares de norte-rio-grandeses lá passaram. Além dela, os americanos construíram uma base aerofluvial às margens do rio Potengi, “não apenas para abrigo e operações das grandes lanchas PT de combates anti-submarinos, como necessária aos menores hidroaviões anfíbios de transporte de cargas” (MEDEIROS, 2001, p. 125).

Tarcísio de Medeiros destaca a “Conferência de Natal”, realizada a 28 de janeiro de 1943, onde o presidente Getúlio Vargas, do Brasil, e o presidente, Franklin Roosevelt, dos Estados Unidos, a bordo do Cruzador Humboldt, fecharam vários acordos de cooperação e aliança militar e civil (MEDEIROS, 2001, p. 125).


Além de destacar a brilhante liderança do Almirante Ary Parreiras na Base Naval de Natal, Medeiros mostra que as baixas da Marinha brasileira chegaram a 476 mortos em serviço ativo, ultrapassando o número de pracinhas da FEB na Itália. Os maiores efetivos eram do Exército assim como as maiores atribuições. Muito material norte-americano foi utilizado, incluído os Jeeps (2001, p. 128).

A figura do soldado tornou-se significativa no cenário natalense. Seus hábitos e rotinas se mesclaram às da cidade. Seu treinamento era melhor que seu equipamento e armamento, que só foi melhorado a partir de junho de 1944, quando a 14 D.I, começou a receber equipamento mais moderno (MEDEIROS, 2001, p. 129-131).

A importância de Natal pode ser verificada a partir da declaração do General em Chefe dos Exércitos Aliados, Dwight Eisenhower em 1946:

Tive muita satisfação de pisar o solo do lugar de que tanto cogitei durante a guerra. Natal teve, como todos sabem, influência decisiva na guerra, possibilitando às Nações Unidas as maiores facilidades para alcançar seus objetivos (MEDEIROS, 2001, p. 130).

Natal foi importante e continua expressando sua importância na presença do Centro de Lançamentos da Barreira do Inferno e de sua Base Aérea. Daqui foram lançados as bases para a derrota do Afrika Korps de Erwin Rommel e para a Campanha da Itália, assim coma a queda do Nazi-facismo na Europa.

Bibliografia

CASCUDO, Luís da Câmara. História da Cidade do Natal. Natal: RN Econômico, 1999.

MARIZ, Marlene da Silva, SUASSUNA, Luiz Eduardo Brandão. História do Rio Grande do Norte. Natal: Ed. Sebo Vermelho, 2002.

MEDEIROS, Tarcício. Estudos de História do Rio Grande do Norte. Natal: Tipografia Santa Cruz, 2001.

Por Thadeu de Sousa Brandão - Sociólogo, Mestre e Doutor em Ciências Sociais pela UFRN. Professor de Sociologia da UFERSA. Coordenador do GEDEV (Grupo de Estudos Desenvolvimento e Violência). Consultor de Segurança Pública da OAB/Mossoró. Membro da Câmara Técnica de Mapeamentos de CVLIs da SESED/RN. Autor de "Atrás das Grades: habitus e interação social no sistema prisional".