terça-feira, 1 de setembro de 2020

Conheçam a belíssima História de Barra do Cunhaú/RN


*Por Erivan Ferreira -
 Livro "Memórias de Canguaretama Vol. I".

Créditos da Foto: Iraktan Ramos

Localizada no município de Canguaretama, agraciada por lindas paisagens; manguezais; piscinas naturais e rios de águas verdes e límpidas, Barra do Cunhaú tem em seu nascedouro, uma grande relevância histórica. O lugar foi palco de disputas e muita cobiça, aparecendo em mapas da época com a denominação de “Corimataí”.

Por volta de meados do século XVI, após terem sua embarcação encalhada na costa da praia, marinheiros oriundos de Dunquerque (cidade portuária localizada no norte da França), edificaram uma fortificação no local para que fosse utilizada como abrigo até a chegada do resgate. Edificado com pedras encontradas no litoral, anos mais tarde, na mesma encosta, surgiria um Fortim que seria palco de duas importantes batalhas e que marcaria a história de Barra do Cunhaú.

Passados 84 anos, estando sob o comando de tropas portuguesas instaladas na fortaleza, o local foi utilizado para combater as sucessivas tentativas dos holandeses de estabelecer seu domínio na região. Desta forma, estava assegurado o apoio militar aos moradores do Engenho Cunhaú, que distanciava apenas 18 km da guarnição e que era o principal fornecedor açúcar e alimentos, sobretudo de carne bovina para a capitania do RN e a outras regiões.

O Fortim da Barra possuía formato quadrangular duplo e estava resguardado por rígidas muralhas com aproximadamente 3,5 metros de altura, nas quais haviam distribuídas estrategicamente dez canhões que disparavam balas de 05 libras e dois arcabuzes de forquilha. Sua guarnição era realizada por um destacamento composto por 27 homens comandados pelo Capitão Álvaro Fragoso de Albuquerque.

Em abril de 1634, a fortaleza sofreu uma tentativa de assalto por tropas holandesas, resistindo com êxito. Durante o ataque, alguns moradores foram degolados pelos invasores.

Após seis meses, na noite de 21 para 22 de Outubro do mesmo ano, o Fortim da Barra seria atacado pela segunda vez. Em uma operação conjunta minuciosamente planejada, partiram do castelo Keulen (Fortaleza dos Reis Magos), 228 soldados por terra, além de 50 índios, liderados pelo experiente coronel polonês Cristóforos Arciszewski e por mar, outra frente de batalha, sob a direção do seu rico conselheiro, Stachouwer. Fazendo uso da escuridão, com grande rapidez e muita violência, o forte foi tomado pelos holandeses, sofrendo consideráveis danos e saques. Porém, os invasores não conseguiram se efetivar na localidade, e ao desatracarem da costa, sofreram um naufrágio, submergindo com toda a sua carga.

Sobre a fortaleza de Barra do Cunhaú, quase nada restou. Suas ruínas foram dizimadas pela ação do tempo e pelas águas do oceano atlântico. Na localidade, surgiu um povoado. Anos mais tarde, suas potencialidades turísticas ganharam projeção internacional.

Passados aproximadamente três séculos, no ano de 1920, a população de Barra do Cunhaú se resumia a 414 habitantes distribuídos por 101 casas.

Na década de 1950, o lugar continuava a ser um pequeno vilarejo formado por poucas casas distantes uma da outra, feitas em sua maioria, com palhas, ou algumas vezes, com taipa e cobertas por palhas. O mesmo acontecia aos banheiros, e que muitas vezes, eram construídos no quintal. O asfalto ainda não existia, tendo sua principal rodovia (Rua da Praia) formada por piçarro.

Boa parte dos nativos residia em sítios. Eram pedestres ou utilizavam cavalos como meio de transporte. O aprendizado ocorria em casa, e posteriormente, na Escola Única Matias Maciel, porém, só havia continuidade até a 4ª série primária. A partir daí, as poucas famílias com melhores condições financeiras, enviavam seus filhos para estudar na capital. Nesta época ainda não havia energia elétrica, as residências eram iluminadas por lamparinas. Os moradores usavam ferro aquecido com carvão em brasas para passar roupas. Também não existia água encanada. Os moradores se utilizavam de cacimbas para beber e cozinhar alimentos. Homes e mulheres transportavam água sob os ombros em grandes latões, pendurados por cordas nas duas extremidades de um pau de mangue. A lavagem de roupas era realizada através de um poço coletivo existente em uma área cercada por matagal e coqueirais próxima ao “pontal”.

A subsistência de grande parte da população se dava através da agricultura e da pesca. Além da captura de camarões e caranguejos. Outros habitantes trabalhavam em salinas. Havia alguns barqueiros que cobravam pela travessia dos “passantes”, dentre os quais, vendedores de grude, que caminhavam a pé da Pipa até a Barra por uma estrada de barro levando cestos repletos de seus produtos sobre a cabeça para serem vendidos em Baía Formosa. O trabalho nos estaleiros era outra opção. Para complementar a renda e o consumo familiar, diversos moradores coletavam mangabas nas proximidades do Juncal e Angelim. Outros recorriam à criação de cabras em seus quintais confinadas em pequenos cercados. Ao completar 18 anos, muitos jovens tentavam ingressar nas forças armadas.

Não havia qualquer assistência médica. Os nascimentos eram feitos com a ajuda de parteiras. As enfermidades eram tratadas com plantas nativas, sendo os casos mais graves resolvidos na Penha. A delegacia de polícia funcionava em um pequeno casebre chefiado por “Chico de Cocó’” e se acaso alguém fosse detido, seria transferido para a sede do município.

Era prática muito comum, a hospedagem de visitantes atraídos pelo veraneio em casas de parentes, uma vez em que ainda não existiam pousadas.

Com o desenvolvimento do distrito sede, muitos alunos se deslocavam em cima de duas caminhonetes pertencentes ao Sr. Fernando para estudar em Canguaretama. No dia da feira livre, diversos nativos percorriam 12 km a pé, ainda na madrugada, para comprar seus mantimentos. Outros vinham no caminhão do Sr. Abraão, veículo que tinha seu motor acionado a partir de um movimento manual por uma manivela. Na Barra de Cunhaú, dentre os poucos comerciantes, ressaltam-se Seu Jeremias, Manoel Canoa e Geraldo Soares.

Em períodos festivos, destacando-se as festas juninas, Natal e fim de ano, as pessoas saiam às ruas para apreciarem as apresentações da lapinha, do pastoril e do coco de roda praticadas por seus moradores, além do boi de reis, realizada por grupos de Tibau do Sul advindos dos distritos de Manibu e Cabeceiras. O carnaval de Barra de Cunhaú ocorria com a participação de alguns blocos conduzidos por sanfona e pandeiros. Muitos idosos costumavam participar. Algum tempo depois, surgiram as primeiras bandas, destacando-se, Sr. Paxicu, dentre outros músicos. A “Burrinha de Roldão” era uma atração muito apreciada, além do Bloco do Peixe.

No imaginário popular, possuíam destaques a lenda do “batatão” e os relatos de pescadores a respeito de supostas visões de almas pagãs pedindo ajuda para atravessar a praia durante a noite.

A padroeira de Barra o Cunhaú é Nossa Senhora dos Navegantes. A data é comemorada no dia 27 de janeiro e é encerrada com uma procissão marítima orquestrada por embarcações conduzindo a imagem da padroeira. Por terra, muitos fiéis seguem através de um cortejo.

A partir de 1977, diversos loteamentos foram surgindo em Barra do Cunhaú. Em sua maioria, empreendimentos imobiliários.

*Erivan Ferreira é professor e escritor em Canguaretama/RN.

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